quinta-feira, março 16, 2006

3.º Capítulo

Capítulo III
O desespero

Lisboa, 15 de Setembro de 2005

Eram 10h da manhã encontrava-me eu no meu escritório quando o telefone toca.
- Dr. Filipe, está um senhor na linha 1 com uma voz aflita e que precisa de falar urgentemente com o Dr..
- Mas disse o nome? É nosso cliente? – perguntei eu.
- Penso que disse que era Gonçalo.
- Ah, sim… pode passar Margarida, eu vou atender, obrigado.
- Sim… Gonçalo…
- Filipe preciso de falar contigo… preciso de fazer alguma coisa… não posso ver mais aquele monstro… - dizia o Gonçalo numa voz aflita e de quem tinha estado a chorar.
- Calma, vá com calma… o que se passou…
- Tu és Advogado, tens de me ajudar, isto não pode ficar assim… aquele… nunca pensei que fizesse uma coisa dessas…
- Mas o que se passou?... Onde estás?...
- O meu padrasto… expulsou-me de casa…
- O que? Mas o que se passou para ele fazer isso?
- Foi ontem… precisava de falar com a minha mãe… depois de jantar contei-lhe que gostava de homens e que andava com um rapaz… só que o meu padrasto ouviu a conversa…
- Ah!!! – a minha surpresa não sei se terá sido de admiração ou de medo. Será que ele teria dito alguma coisa do que aconteceu naquela noite?
- Conheci um rapaz no Act por quem acho que me apaixonei e senti que precisava de contar à minha mãe.
Naquele momento suspirei de alívio apesar de toda a situação dramática.
Uns meses após a morte do pai do Gonçalo a mãe conheceu um individuo que basicamente infernizou a vida dele.
O individuo tinha-lhes, quer ao Gonçalo quer à Joana, uns ciúmes e fazia-lhes imensas chantagens psicológicas.
Há quem dissesse que ele chegou-lhes a bater, mas nunca houve prova disso, nem eu pensei que tal pudesse acontecer.
O senhor parecia ser “normal”. Era engenheiro metalomecânico de uma empresa na Maia, mas como diz o ditado quem vê caras, não vê corações…
- E ele expulsou-te? Como assim? Não estas a exagerar?...
- Sim… Filipe! Ele bateu-me!...
- Mas…
- Atirou-me ao chão… deu-me pontapés por todo o corpo… a minha mãe chorava e pedia-lhe para ele parar...
- Então e tu não fizeste nada?
- Não consegui ter reacção… sentia os seus pés a virem contra o meu corpo e a sua voz de cão raivoso a insultar-me de tudo e mais alguma coisa…
- E a tua mãe não te acudiu? E a Joana não estava em casa?
- Só estava a minha mãe… acho que ela estava em estado de choque quer pelo que eu lhe disse quer pelo que ele fazia… só chorava… Quanto à Joana, apareceu uns 15 minutos depois e acho que foi a minha salvação senão… não sei onde estaria agora…
- Então e que aconteceu depois?
- A Joana ajudou-me a sair de casa e saímos… depois conto-te vou ter de desligar por agora…
- Espera Gonçalo…
A chamada terminou por ali. Fiquei perturbado com tudo aquilo. Tentei ligar-lhe de seguida mas todas as tentativas foram em vão.
Tentei inclusive ligar para a Joana mas não consegui.
- Dr. Filipe!!! – a minha secretaria tinha entrado naquele momento no escritório.
- Ah… a sim Margarida entre… diga…
- Está tudo bem Dr.? Parece algo preocupado.
- Nada de especial… diga lá…
- Está tudo à sua espera…
- Diga que vou já.
Toda a direcção da empresa reunia-se hoje para apresentar os novos presidente e vice-presidente da sociedade. A agitação era enorme porque ninguém sabia quem iria substituir o velho Gonçalves na presidência.
O meu nome era apontado como sendo uns dos possíveis substitutos. Confesso que não queria, gostava de estar mais perto das bases e o facto de um lugar mais cimeiro implicaria quase o estatuto de intocável por parte de todos os outros.
Enquanto decorria a reunião da Direcção, no Porto as coisas tinham mais desenvolvimentos.
O Gonçalo tinha-se envolvido com um rapaz de 25 anos, cabelos alourados, olhos esverdeados e corpo bem feito.
Tinham-se conhecido no Act. Um cruzar de olhares, um sorriso de cumplicidade, um toque deliberado… o bastante para um olá.
Naquele momento o Gonçalo sentiu o despertar do amor…
O rapaz chamava-se Miguel e era finalista do curso de literatura e língua portuguesa na Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
O Miguel vivia só num apartamento junto à Boavista, e fora ele quem acolhera o Gonçalo naquele dia. Fazia já 2 dias que estavam os dois juntos.
- Estás bem? Com quem estavas a falar? – perguntou Miguel.
- Com o Gonçalo, sabes aquele que te falei que está em Lisboa! – respondeu o Gonçalo ainda com a voz tremula.
- Ah… o tal advogado…
- Não estejas com ciúmes… já te contei que somos apenas bons amigos.
- Não disse nada…
- Pois mas o teu tom de voz deu para perceber.
Naquele instante o Miguel abraçou o Gonçalo e passando as mãos pela sua cara disse-lhe:
- Achas? Sei que posso confiar em ti. Apenas estou preocupado contigo.
Os seus lábios tocaram-se e beijaram-se apaixonadamente enquanto as mãos percorriam todo o corpo.
- Miguel?...
- Sim lindo.
- Gostas de mim?
- Claro que sim. Amo-te muito, e não será o teu padrasto ou quem quer que seja que nos vai separar.
Gonçalo tornou a beijar os lábios do Miguel e deixou-se adormecer no seu colo.